Mate, “dulce de leche” e COVID-19

ESCRITO POR: RODRIGO FOLTER

Vivendo na comunidade sul-americana que venceu o vírus

A chegada ao Aeroporto Internacional de Carrasco, 13 de março, não poderia ser mais assustadora. Diretamente de thriller “Contágio” homens aparentados, questionário sobre sua saúde e a ordem de 15 dias esperavam as pessoas que desembarcavam na madrugada gélida de Montevidéu.

A ideia inicial era uma estadia curta no país. Não era a primeira nem a segunda vez lá, e o pequeno e acolhedor país faziam meus olhos brilharem e me convidava a morar, só não sabia que seria de forma tão abrupta.

O Brasil computava 23 casos de COVID-19 e começava a tomar precauções para evitar o alastramento do novo vírus. Lá no Uruguai o povo liderado pelo presidente recém eleito Lacalle Pou teve as primeiras confirmações de COVID-19 dia treze, quatro casos, e onze dias depois, com pouco mais de 90 casos confirmados decidiu fechar a entrada ao país por qualquer rota. Respira, inspira e não pira.

Senso de comunidade

 Segundo o PISA – Programa Internacional de Avaliação de Alunos – o Uruguai ocupa a segunda posição no ranking de qualidade de ensino na América Latina, atrás apenas do Chile, segundo dados de 2018. Isso escancarou o que outras passagens pelo Uruguai haviam mostrado. O povo realmente se preocupa com o outro, mesmo que não faça parte do seu núcleo de pessoas.

Estabelecimentos fecharam rapidamente e se adaptaram à vida online, entregas se tornaram a norma e os cidadãos aderiram com urgência a nova realidade. Só saía quem realmente precisava. Empresas aderiram a paralisação, mesmo sem obrigatoriedade, e algumas se mantém em home office até hoje. As pessoas até deixam de compartilhar o mate, vê se pode?!

Ao longo das duas semanas de isolamento necessários os cuidados nos estabelecimentos foram aumentando cada vez mais. Apenas quatro pessoas nas farmácias por vez, algumas com portas fechadas e o atendimento se dava por uma janela, mercados exigiam o uso de máscaras e uma pessoa do núcleo familiar por vez. Além de horário específico para idosos e congelamento dos preços de todas as redes de mercado por três meses.

O que surpreendeu não foi a resposta rápida do governo, mas o quão dispostos a se sacrificarem pelo próximo estavam os cidadãos do país. Para alguém de fora, preso durante um período histórico, vivenciar a irmandade, compaixão e apoio ao próximo foi uma das coisas que mais marcaram a estadia no país. Essas qualidades não tem nada a ver com a quantidade de gente, são características que deveriam ser inerentes ao homem, independente de bandeira. O Brasil está com quase 2 milhões de casos. Isso é mais da metade da população do Uruguai. Imagina se não fosse assim no país de Galeano.

A normalidade no país começou a ensaiar seus passos nas primeiras semanas de maio. A abertura de restaurantes e bares antecederam salões, academias e outras atividades. As aulas retornarão em breve, com turmas reduzidas e algumas empresas buscavam saber de seus empregados o que achavam de um retorno gradual.

Na penúltima noite em solo uruguaio um belo deleite foi possível graças a união do povo. Um encontro, se não fossem as máscaras e menu digital, igual a antes da pandemia. Risos, tim tins e cerveja formaram a despedida do país e formavam a expectativa de retorno ao Brasil.

Visão de lá para cá

Brasil e Uruguai são muito próximos. Geograficamente, mas principalmente emocionalmente. A conexão que se forma entre povo brasileiro e uruguaio devido ao sangue quente latino é bonito de ver. Dividimos até o amor pelo carnaval, fazendo com que ambos os países atraiam seus cidadãos.

Mas além de dividir esse sangue, o Brasil tem grande influência econômica e política no país. Notícias sobre o Brasil são normais, assim como aulas de português e conversando com algumas pessoas sobre como eles enxergam o combate do Brasil a resposta é quase unânime: É inacreditável o que está acontecendo no Brasil.

As pessoas ficam incrédulas com as atitudes tomadas pelo nosso presidente, temem que o vírus se espalhe vindo do sul, já que a quarentena no Brasil sempre foi mal feita, e se compadecem pelo número crescente de casos no país.

Até o fechamento da matéria o Uruguai registrava 985 casos confirmados com três novos casos no dia nove de julho, 886 recuperados e 29 mortes. Dados do dia 09/07/20.

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