Céu e Inferno – Parte 1

Considero-me uma pessoa privilegiada. Não por riquezas materiais, ou por dotes físicos, ou cargos de chefia e liderança, contatos com personalidades, incontáveis viagens pelo mundo, por causar inveja em outras pessoas ou qualquer diferença que produza essas reações e brilhos duvidosos nos olhos daqueles que observam à distância. Ao contrário, minha sensação não vem de coisas, objetos, lugares ou pessoas anônimas, mas daquilo que representam, da história que ajudaram a construir, das emoções e experiências que compartilharam e, em especial, pela oportunidade de me permitirem crescer, nos valores, na ética, na ciência e na consciência!

Cresci na segunda metade do Século XX, portanto sou do milênio passado! Um tempo de coisas antigas e velhas, muitas ultrapassadas e esquecidas, como é normal de acontecer, afinal, para muitos, o futuro só é alcançado quando caminhamos para a frente, buscando nos aprimorar como espécie, como cultura e civilização.

Mesmo assim, cresci com algumas “velharias”: aprendi muito sobre a vida, não a humana, apenas, mas a vida como a Natureza nos mostra, graças às infinitas aventuras de Jacques Cousteau, em seu Calypso, navegando as águas misteriosas deste planeta enquanto mesclava a Oceanografia com os hábitos e cultura das populações humanas que usufruíam – e exploravam inconsequentemente – os benefícios das águas próximas e da vida que abrigavam.

Outra dessas “velharias” me levou a perguntar mais sobre o mundo e as pessoas à minha volta, despertou minha curiosidade para o todo e como coisas tão distantes quanto uma torta de maçã e a quebra de átomos podem conviver. Carl Sagan foi responsável por me ajudar entender que ter uma mente científica não é exercitar a memória como se fosse uma enciclopédia, mas, ao contrário, sempre buscar saber – e pesar! – mais.

É uma infinidade de padrinhos e madrinhas que tive na minha formação como pessoa…

Bach, Beethoven, Vangelis, Queen, Chico Buarque, Carlos Gomes…

Asimov, Lobato, Christie, Doyle, Assis…

Connery, Montenegro, Duarte, Pfeiffer…

Além de professores e amigos a perder de vista!

Passei anos da minha vida como uma esponja, algo que sempre sugiro aos meus alunos. Observar o mundo à sua volta, absorver o máximo, construir seu repertório e usá-lo de uma maneira produtiva, não pessoal, mas para o coletivo. Antes de questionar – “será?” – pergunte, algumas vezes, “por que?”… e exercite seu pensamento, sua inteligência, seu conhecimento sem restrições, apenas preservando a ética e moral que conduzem sua consciência.

Com o tempo, a esponja foi mudando… ainda absorvendo muito de tudo, mas com certa parcimônia, um pouco mais seletivo e crítico. Nem tudo era interessante, principalmente porque algumas vezes me deparei com uma versão absurda, obscena e distorcida da realidade. Sempre procuro manter o humor para algumas dessas aberrações. Delego à falta de conhecimento de quem as propala, uma condição temporária que faz com que, depois de descobrir que cometeu uma falha, corrige-se. Ninguém é sabedor de tudo, mas é fundamental sempre considerar suas limitações e se manter receptivo às novidades. Equivocar-se com uma data, lugar ou conceito mais abstrato é absolutamente normal. Fazê-lo consciente disso, sabendo que desencadeará efeitos negativos e destrutivos a outros, é criminoso.

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