Festa estranha com gente esquisita – Parte 3

César Belardi

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Poderíamos seguir com estas referências por páginas sem fim, discutindo casos específicos e as questões relacionadas ao espaço de representatividade, lugar de direito ou de fala, igualdades, inclusões como se fosse algo inédito, independentemente de ter ou não aspas em algum lugar. O paradoxo está em retomar-se essas discussões como olhares de surpresa, simplesmente porque um grupo desavisado não percebeu que o tempo passou. Ouvi dizer que os mesmos super-heróis que causaram a fúria com seu beijo homoafetivo, ao que parece, já se casaram e planejam adotar uma criança!

Essa realidade já está presente nas produções culturais, fazem parte do cotidiano, novamente sem um juízo de valores para o certo ou errado subjetivo. Representam um tempo, uma sociedade, uma conduta. A franquia “Star Wars” sempre explorou a diversidade. É fato que já foi melhor ao fazer isso sob a direção de George Lucas, mesmo nos anos 70 e 80, quando ainda era novidade e não se sabia muito bem como fazer esse tipo de representação. Atualmente, o Padrão Família Disney está prejudicando um pouco essas ações, tornando-as “politicamente corretas”. Um discreto beijo – novamente, ele – entre duas mulheres, no último filme da franquia, causou desconforto exatamente por ter sido discreto demais.

“Star Trek” fez o mesmo, desde os anos 60, muito mais no campo ideológico e social, basta lembrar da sua marca na televisão mundial ao promover o primeiro beijo (!!!) interracial. No cinema, em 2016, apresentou um dos personagens clássicos, o Tenente Sulu, casado com outro homem, ambos pais de uma menina, algo que reflete a vida real, depois que o ator que o interpretou pela primeira vez, George Takei, declarou sua relação estável, possivelmente uma inspiração e homenagem a ele.

Em 2018, “Perdidos no Espaço”, uma releitura do seriado clássico, tem o personagem do Dr. Smith interpretado por uma mulher, Doutora Smith, malévola como só ela; mais de uma década antes, em 2004, “Battlestar Galactica” fez o mesmo com Starbuck, um bom vivant.

Li, há poucos dias, que está crescendo a tendência para a publicação de Quadrinhos de Direita, citando figuras públicas e seu apreço por alguns personagens de HQ, criando uma percepção, uma distorção absurda sobre essa forma de produção artística e cultural. A sensação foi de um cenário de confronto que se estabelece, como uma ameaça desnecessária, um mesmo confronto entre “direita” e “esquerda” que ignora quão ultrapassados e desatualizados estão esses conceitos.

Para cada ação, uma reação. Do ponto de vista de uma sociedade mais moderna, provocações deveriam ser ignoradas. Estávamos em um caminho muito bom, não definido e resolvido, mas avançando para condições mais humanas relacionadas a todos esses conflitos. Estávamos percebendo e convivendo muito bem, obrigado, com a ideia de que somos todos iguais por sermos diferentes! Sem estranhezas ou esquisitices. As artes, a cultura, a ciência, a qualidade de vida sendo vistas de maneira séria, responsável, com suas falhas inevitáveis que, com boa vontade e maturidade, poderiam ser corrigidas sem conflitos insanos. As provocações que são feitas, e a maneira como são respondidas, interrompem esses avanços. Na verdade, tem proporcionado um retrocesso vergonhoso em muitas áreas.

Eu sugeriria uma faxina em casa. Uma daquelas bem feitas, que revira tudo, e descarta o que está quebrado e velho.

Poderíamos começar limpando os próprios espelhos…

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