“A maioria de nós jamais enfrentou algo semelhante anteriormente”

Médico infectologista, Tiago Gomes

FOTO: Médico Infectologista, Tiago Gomes

ESCRITA POR: MARCOS PITTA

Infectologista fala sobre o vírus e explica que ainda é preciso descobrir muita coisa sobre ele. 

O Coronavírus chegou e mudou a vida de todo mundo. Quando esse “todo mundo” entra na oração, está em seu mais completo e perfeito significado, todo o globo sofreu com o vírus, a OMS declarou pandemia e nos modificamos. Comércios fecharam, shoppings também, reuniões com os amigos acabaram, o trabalho do escritório foi substituído por um cômodo da casa, o happy hour com os amigos pós-expediente foi cancelado de uma hora para a outra. E pessoas continuam morrendo.

Mesmo assim, com os inúmeros pedidos e recomendações de isolamento e distanciamento social, as pessoas continuaram a sair de casa e a pandemia, desde março, quando se iniciou, de fato, no Brasil, persiste, e mesmo com a retomada e tentativa de flexibilização, ainda há muito o que se falar sobre este acontecimento, as marcas que a pandemia vai deixar em diversos setores e principalmente na vida das pessoas.

Por isso, a ComTempo não poderia deixar de entrevistar um médico infectologista que está atuando diretamente em áreas que recebem pacientes com a Covid-19.

Tiago Gomes, antes da pandemia, atuava junto a pacientes com HIV e tuberculose, no Hospital de Referência de João Pessoa, na Paraíba, e também trabalhava como controlador de infecção hospitalar. Ele conta que com a pandemia, “os esforços dos infectologistas foram direcionados para fornecer suporte técnico e também força de trabalho para abarcar os casos novos de pacientes suspeitos ou confirmados de Covid-19, rotina bastante extenuante devido ao número de casos e complexidade dos paciente que chegam aos hospitais”, explica.

Abaixo, separamos na íntegra, a entrevista que Gomes concedeu a ComTempo sobre a doença, prevenção e o que se sabe até o momento. Para registro, essa matéria foi finalizada em julho de 2020 e, por isso, alguns detalhes podem ter sido alterados quando essa matéria for lida, pois ainda estávamos vivenciando essa triste realidade.

ComTempo – O que é ou o que já se sabe sobre o novo coronavírus?

Tiago Gomes – O vírus Sars-CoV-2 faz parte de uma família Coronavírus em que outros 6 tipos já eram conhecidos. O novo coronavírus, responsável pela doença Covid-19, que se tornou conhecido em dezembro de 2019, pode causar acometimentos leves, mas também pode cursar com gravidade, com acometimento pulmonar e de outros sistemas, podendo levar o paciente a óbito. 

CT – Há diferenças entre ele e sua “família” de vírus? Quais?

Tiago – A diferença entre o novo coronavírus em comparação aos que já eram conhecidos, é que não é possível determinar de forma exata a forma que o vírus afeta o corpo. Apesar de muitos estudos publicados, ainda há muito a se conhecer sobre o comportamento e atuação da Covid-19, e para que se efetive todo esse conhecimento, infelizmente é necessário um tempo maior, além  de pesquisas mais robustas. 

CT – Quais os principais sintomas da Covid-19 e quais as formas de contágio?

Tiago – Os principais sintomas da infecção pelo novo coronavírus são similares ao de qualquer outro quadro viral, que incluem: febre, dor no corpo, dor de cabeça, vômito, diarreia e tosse, acompanhada ou não de falta de ar. Não necessariamente o paciente apresentará todos os sintomas. A expressão de sintomas está diretamente ligada à resposta eficaz, ou não, da imunidade do paciente. Em relação à forma de contágio, há três formas conhecidas:

– Gotículas: eliminadas durante o falar, espirrar, tossir;

– Aerossóis: eliminadas em procedimentos que geram aerossóis como nebulização, entubação, aspiração de secreções pulmonares quando o paciente está intubado;

– Contato: por meio do toque em superfícies e objetos contaminados.

CT – Quais as principais formas de prevenção?

Tiago – As principais formas de prevenção são: evitar aglomerações; lavar bem as mãos com água e sabão ou higienizar com álcool gel a 70% nos momentos em que não for possível realizar a lavagem com água e sabão; manter a etiqueta no ato de tossir ou espirrar, utilizando o cotovelo caso não haja lenço descartável disponível para uso; usar máscaras (de tecido) conforme atualmente indicado pelos órgãos governamentais. Sempre digo que é necessário ter bastante cautela com o uso das máscaras, pois durante o uso delas, as pessoas podem ter uma falsa sensação de segurança, no que pode levar ao descuido em relação a todas as outras precauções, podendo trazer contaminação ao tocar a máscara/rosto com as mãos que não foram higienizadas adequadamente.

CT – Cientificamente, o que já foi descoberto até o momento sobre o novo coronavírus? 

Tiago – Ao longo dos últimos 5 meses, muita coisa foi produzida, estudos foram realizados a fim de compreender o comportamento do vírus, sua forma e grau de infectividade, tempo de permanência em suspensão no ambiente e também o tempo que o vírus permanece viável em superfícies e em objetos, além de outros estudos que visam a formulação de uma vacina para efetivo combate ao vírus.

CT – Como analisa o avanço tão intensificado da doença no Brasil? Já chegamos ao pico?

Tiago – Com relação ao avanço do vírus, quando fazemos um traçado histórico desde o primeiro paciente no país, bem como os casos que foram surgindo posteriormente, conseguimos compreender que a disseminação pode ter acontecido durante o período do carnaval, pois nosso país recebe milhares de estrangeiros. Neste ano, durante esse período, muitos países já registravam disseminação do vírus. Quando avaliamos as cidades com números mais expressivos de casos, vemos que são centros com aeroportos que recebem muitos voos internacionais e que costumam receber turistas no período carnavalesco.

Com relação ao pico, não é possível afirmar que chegamos a ele no país inteiro. Vale salientar que o pico ocorre em momentos diferentes entre as diversas regiões do país. Essa diferença de datas entre os picos regionais está intimamente ligada ao período que a epidemia começou em cada local, bem como a organização e estruturação dos serviços de saúde e formas de enfrentamento da crise pelos órgãos governamentais de cada lugar. 

CT – Seguindo esta elevação constante nos casos confirmados e mortes, é possível estimar quantas pessoas ainda serão acometidas pela doença no país?

Tiago – A estimativa em relação ao número de  casos está presente em estudos já lançados. Mas o número real de casos só é possível ser visto ao longo do tempo. Fatores externos podem interferir positiva ou negativamente nos estudos, mudando o real número de infectados ao longo do tempo.

CT – Muitas pessoas ainda parecem ignorar as medidas preventivas em relação à doença e até mesmo a gravidade da pandemia no país e no mundo. Por que isso ocorre? 

Tiago – A maioria de nós jamais enfrentou algo semelhante anteriormente. Aqui no país, em questão de semanas, toda a rotina de milhões de pessoas mudou de forma drástica. É algo que mexe com o emocional e também exige maturidade. 

A pandemia serviu de gatilho para transtornos emocionais, em pessoas da área da saúde e naqueles que não trabalham na área. 

Muitos ignoram a pandemia, outros necessitam se manter fora das suas casas para manter suas famílias. 

Nesse momento é necessário maturidade e serenidade para entender que todos estamos cercados de uma mesma tempestade, mas o material que compõe cada embarcação é o que diferencia uns dos outros, e cada pessoa sabe os limites e possibilidades da sua trajetória. 

CT – Qual seria a maneira mais eficaz de conscientizar todas as pessoas para a prevenção da Covid-19?

Tiago – A forma mais eficaz de conscientização da população é por meio da educação em saúde, de forma diária e permanente. 

CT – Como tem sido sua rotina diária na pandemia, e como se previne?

Tiago – Tenho redobrado os cuidados, principalmente na volta pra casa. Temos que agir de forma responsável nesse retorno ao lar para que tenhamos um grau de segurança enquanto estamos dentro do nosso lar. Existem algumas dicas que sempre dou aos meus paciente. Além de lavar as mãos com água e sabão ou higienizar com álcool gel a 70% naqueles casos em que a lavagem de mãos não é possível, outras medidas de higiene podem ser adotadas:

– Deixar sandálias e sapatos fora de casa, evitando levar pra dentro do domicílio possível contaminação;

– Após as compras, lavar ou higienizar todos os itens comprados antes de guardá-los nos armários ou colocá-los na geladeira;

– Higienizar objetos utilizados fora de casa, principalmente o celular, grande responsável pela disseminação de microorganismos nocivos à nossa saúde;

– Higienizar as bolsas, chaves e outros objetos usados no dia a dia;

– Não compartilhar objetos pessoais;

– Evitar apertos de mãos, abraços ou beijos;

– Reforçar a higiene da casa como medida preventiva;

– Evitar misturar as roupas utilizadas para as atividades com outras roupas limpas. Recomenda-se que sejam lavadas assim que chegar em casa;

– Ao chegar do trabalho, tomar banho antes de qualquer outra atividade.

Adotando essas medidas, é possível diminuir drasticamente a chance de contrair o coronavírus.

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