O coral mais antigo do Estado de São Paulo está de pé. E na luta!

Conheça o Coral Municipal Maestro Pedro Pellegrino: Incessantes 90 anos com impacto social imensurável.

Escrito por: Kimberly Souza

Primeiro ato. A comunidade artística da cidade de Bebedouro, SP, assiste, lotando a câmara da cidade, ao desenvolvimento do Plano Municipal de Cultura, que em breve será votado pelos vereadores.

“Estamos acostumados a fazer arte, mas não estamos acostumados a sentar, planejar e falar de políticas públicas”, afirma o coordenador de Teatro, Museus e Biblioteca, Rogério Carlos Fábio, que tomou a frente na construção do Plano. Um fio de esperança no meio da descrença.

Enquanto essas pessoas discutem, tardiamente soluções concretas e sustentáveis para fazer os movimentos artísticos resistirem na cidade, teatro, biblioteca e museus estão fechados por falta de verba.

Segundo ato. Na contramão da realidade decadente, o Coral Municipal Maestro Pedro Pellegrino completa, em 2020, 90 anos de atividades ininterruptas, tornando-se o coral mais antigo em atividade do Estado de São Paulo. Resistência. E mobilização social.

O fato veio à tona na redação da ComTempo através de Nathan Santos, 32, professor, produtor, pesquisador e amante das artes com olhos marejados, como se define. É ele, inclusive, que narra a história desse coral nas primeiras páginas da revista.

Nathan dedicou seu último ano de faculdade na construção bem fundamentada dessa história que, por décadas, se mantinha viva somente na voz de quem cantava no coral.

“Minha professora de Licenciatura em Música era pesquisadora da Orquestra Sinfônica de Ribeirão Preto e me incentivou a procurar um assunto ligado à cultura da minha cidade para trabalhar no último ano de faculdade. Lembrei do Coral Municipal e, ao pesquisar, percebi que não existia nenhum registro escrito exceto algumas reportagens”, lembra.

A partir daí, Nathan começou a contar essa história jamais registrada, especialmente conversando com integrantes e ex-integrantes do coral, e também com pessoas próximas ao fundador do grupo, o maestro Pedro Pellegrino.

O coral surgiu em 1930, na antiga escola Paraíso Cavalcanti. Inicialmente, o estilo cantado era o Orfeônico, fazendo referência ao deus grego Orfeu. Trinta anos depois, o coral passou a interpretar músicas sacras, ligadas à Igreja Católica.

O maestro Pedro Pellegrino, que guiou o coral desde os primórdios, sempre foi uma grande inspiração para todos que passaram por sua regência e também por quem teve o prazer de ver o coral de apresentando por várias cidades.

“O Seu Pedrinho escreveu diversas músicas litúrgicas e uma delas, Encontrei-me com Deus, tive a oportunidade de refazer toda a partitura. Apresentei-a na Igreja Matriz de São João Batista, tocando o órgão de tubos e também fiz questão de levar essa experiência para a banca do meu TCC”, relembra Nathan.

Ao longo de quase um ano de jornada, o pesquisador percebeu que, além da importância histórica e cultural, o Coral Municipal tem uma importância social.

Imagine quantas pessoas não passaram pelo coral nessas 9 décadas? São essas pessoas que carregaram em si, essa história importante. O trabalho do Nathan foi o de captar, organizar e registrar, para sempre, o que muitos ouviram e ainda ouvem, em algo que se possa ler, entender e valorizar.

“Minha intenção é deixar um registro para a cidade. O coral tem uma importância muito grande, mas que foi perdendo prestígio e investimento com o tempo. Ainda assim, está vivo”.

A reportagem acompanhou, em uma tarde de sábado, um ensaio do Coral Municipal, agora regido pelo maestro Glauco Correa.

Dentre aquecimentos vocais e a interpretação de músicas brasileiras, entrevistamos duas figuras importantes da equipe: a soprano Maria Inês Breviglieri e a contralto Juliana Prata. Além da paixão pelo canto coral, o que une as duas mulheres cantoras é a abertura que o coral tem para todos e todas, independe da geração.

“Entrei no coral em 1999, incentivada pelos meus irmãos, que já cantavam. Eu cresci familiarizada com as músicas do Seu Pedrinho, e quis ver de perto como é. Hoje o coral é minha família, é meu espaço e onde traduzo meus sentimentos em música”, afirma Maria Inês.

Vinte anos depois, no final de 2019m a nutricionista e professora Juliana Prata é quem decidiu fazer parte do coral.

“Entrei porque era um momento que queria para mim. A música faz parte da nossa vida, mas eu queria uma música que tivesse história e brasilidade, por isso vim para o canto coral. Eu queria aprender a cantar, e aqui no coral, todo mundo aprende. São todos muito unidos, é um lugar muito leve, eu não vejo o tempo passar e, de repente, estou cantando uma frase completa no tom certo”, diz a contralto, que se prepara para uma das primeiras apresentações.

O Coral Municipal Maestro Pedro Pellegrino, em meio à sua simplicidade, mostra que a resistência tem sido a chave para nos mantermos vivos nessa época de desvalorização. A luta do Nathan ao reconstruir essa história jamais contada, e a do Rogério ao insistir firme no Plano Municipal de Cultura é a mesma de várias pessoas e grupos que enxergam na arte e na cultura, uma salvação em meio a tempos tão hostis.

Deixe uma resposta