Os impactos da polarização política sobre a saúde mental dos brasileiros

Josiane Santos

“A alma brasileira está doente”.

As palavras do filósofo, teólogo e professor aposentado de Ética, Leonardo Boff vão ao encontro de uma pesquisa da OMS (Organização Mundial da Saúde), que afirma que o brasileiro é o povo mais ansioso do mundo. 

De acordo com o estudo, o país está passando por uma epidemia de ansiedade, com 18,6 milhões de pessoas que apresentam o transtorno. Esse número representa 9,3% da população.

Além da ansiedade, sentimentos como medo e preocupação também são frequentes nos consultórios psiquiátricos do o país, porém um novo fator tem sido cada vez mais citado: o temor pelo cenário político.

Para o psiquiatra Luiz Scocca, o debate político acalorado pelo qual o país passou nos últimos anos, fez com que aumentasse o número de pessoas que se sentem inseguras diante das consequências dos resultados eleitorais.

“Cada pessoa reage de um modo diferente às situações de mudança ou tensão, como um processo eleitoral ou uma crise econômica. Acontecimentos assim podem gerar desde sentimentos pontuais, como medo e frustração, até quadros mais graves de doenças da mente, como ansiedade e depressão, entre outras. Nos últimos tempos o número de pacientes com esse perfil tem aumentado em meu consultório” – afirma o psiquiatra.

De acordo com a cientista política Débora Sanchez, a polarização política tem influência direta sobre essa realidade, uma vez que fomenta sentimentos extremos, contribui para debates acalorados e até mesmo provoca o rompimento de relações pessoais.

É o caso do estudante Lucas Almeida, que abandonou propositalmente o relacionamento com familiares e amigos, devido a posicionamentos políticos diferentes. Segundo o estudante, a decepção com a escolha de voto de pessoas próximas estava comprometendo negativamente sua saúde mental.

“Em um ambiente democrático é natural que existam divergências políticas, porém quando a diferença de opiniões se sobrepõe a questões relacionadas a direitos humanos fundamentais, é preciso repudiar esse tipo de discurso” – afirma o estudante.

Lucas ainda conta que optou por não manter contato até mesmo com amigos e familiares próximos, pois, segundo ele, o convívio gerava tristeza e repúdio.

“As últimas eleições foram muito decepcionantes para mim, pois eu vi pessoas com quem convivia e tinha carinho defendendo discursos que feriam diretamente a dignidade de outro ser humano. Optei por romper relações naquele momento e com algumas pessoas ainda não voltei a conversar” – explica.

As bolhas sociais e suas consequências para a polarização política 

O uso cotidiano das redes sociais facilita o contato entre as pessoas, porém em contrapartida também favorece a formação de “bolhas” onde é possível se relacionar somente com pessoas que tenham posicionamentos semelhantes. 

Na opinião da cientista política Teresa Vicente, esse é um ponto central, que dificulta a troca de ideias e diminui a possibilidade de pensar no outro com respeito e tolerância. 

“É como se a pessoa que pensa diferente fosse um inimigo e não somente um adversário político. O aparecimento de candidatos com fala intolerante, obviamente, contribui para o fortalecimento desse tipo de discurso, que para o grupo contrário pode gerar medo e resistência” – afirma Vicente.

A página virtual @elenaovainosmatar é um exemplo desse tipo de movimento e tem como objetivo denunciar ataques cometidos contra a comunidade LGBT (Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis, Transexuais ou Transgêneros) e gerar uma rede de apoio e proteção.  Segundo relatório do Grupo Gay da Bahia (GGB) houve um aumento de 14% no número de homicídios de pessoas LGBT no último ano.

Para o arquiteto Matheus Faria, movimentos de solidariedade e fortalecimento de comunidades socialmente vulneráveis são necessários, uma vez que as minorias sociais têm dificuldade de representação pública.

A psicóloga e terapeuta Camila Cerrado defende que o caminho passe pelo diálogo, onde cada parte precisa se respeitar e lidar com as decisões coletivas com maturidade e tolerância. 

“O processo de redemocratização ainda é muito recente no Brasil, sendo assim, ainda é preciso amadurecer a ideia de que o outro não é pior por ter uma opinião distinta. Também é necessário entender que quem ganha não tem mais direitos do que quem perde e que a solução para os problemas sociais do país passa pela colaboração de todos” – afirma.

De acordo com a psicóloga, quem se sentir mal ou ameaçado diante do cenário político ou de qualquer outro momento de dificuldade, deve procurar ajuda profissional para lidar com o problema com o devido acompanhamento.

 

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