Pesquisa no Brasil, sim!

Marcos Pitta

Em sua primeira edição, a ComTempo entrevistou Bianca Chieregato Maniglia, que desenvolveu, juntamente com grupo de pesquisadores, um plástico 100% biodegradável. Oito meses depois, voltamos a entrevistar a profissional que contou detalhes sobre os avanços em sua pesquisa, além de comentar sobre a importância de se investir em pesquisa no Brasil, o que vai na contramão dos últimos acontecimentos e decisões do atual governo que tem levado milhares de pessoas às ruas nos últimos dias.

ComTempo: Como está o processo da sua pesquisa para desenvolver o plástico 100% biodegradável? Em que etapa da pesquisa você está? O que mudou da última entrevista que fizemos até o momento?

Bianca: Durante o ano de 2017 e 2018 desenvolvi o meu projeto de pós-doutorado na POLI sob a supervisão da Profa. Carmen Cecília Tadini. O projeto foi financiado pelo órgão da CNPq. Trabalhamos com a produção via extrusão, ou seja, um processo em larga escala, de plásticos produzidos a base de resíduo da extração do óleo de babaçu. Conseguimos obter plásticos com diferentes propriedades, e quando falo propriedades me refiro a cor, resistência mecânica, solubilidade em água entre outras. Também trabalhamos com as blendas que são misturas feitas com diferentes polímeros. Fizemos blendas de polipropileno (polímero convencional, ou seja, proveniente da fonte não renovável, petróleo) com amido proveniente do resíduo da extração do óleo de babaçu (fonte renovável). Este novo material apresentou perda nas suas propriedades mecânicas e funcionais (ex. afinidade pela água) quando comparado com o plástico convencional, mas ainda se demonstrou como propriedades interessantes para aplicação industrial. Durante este período também tive a oportunidade de coorientar o mestrado de Thaís Aímola, com produção de embalagens ativas produzidas a base de amido de mandioca com antocianina (extraído da casca de uva). O que tem de diferente neste material e neste trabalho? Elaboramos este material via extrusão, ou seja, possibilidade de produção em larga escala, trata-se de um material biodegradável e produzido com fonte renovável. A antocianina é um pigmento natural que altera sua cor frente ao pH do meio, podendo então servir como indicadora de mudança de pH. Dessa forma, a inclusão dessa substância nas embalagens permitiu torná-las ativas porque servem para indicar se o alimento condicionado está adequado para consumo ou não, visto que quando o alimento começa a se deteriorar, por exemplo, carne bovina ou peixe, liberam amônia e o pH do meio se altera (fica mais básico). Assim, a coloração da embalagem se altera indicando a mudança de pH.

ComTempo: Seu projeto será prejudicado, de alguma forma, com os cortes anunciados pelo governo recentemente?

Bianca: O meu projeto foi financiado pela CNPq, porém posso dizer que os cortes da Capes estão afetando sim tanto o meu projeto, como toda a pesquisa brasileira. Encontramos problemas como falta de bolsas para os alunos de iniciação científica, falta de dinheiro para compra de reagentes e pagamento de análises. Na área de engenharia é muito complicado o aluno decidir em seguir a carreira acadêmica, ele tem que realmente gostar do que faz. Um aluno de gradução de engenharia ao estagiar em São Paulo chega a cair em torno de 2500 reais, este é o valor acima da bolsa de doutorado. Veja bem, estou falando da bolsa de doutorado (CNPQ e CAPES, 2200 reais). A bolsa de mestrado destes órgãos é de 1500 reais. Portanto, imagina pro aluno a decisão em fazer o mestrado que apresenta uma bolsa com valor menor ou, o que está acontecendo muito com os cortes, a possibilidade da bolsa nem existir. A aluna de mestrado Thaís Aímola que eu mencionei, é um exemplo disso, ela fez todo o seu mestrado sem bolsa, o que pra mim representa uma força de vontade sem tamanho. Portanto, o que vejo acontecer é que estes cortes irão prejudicar imensamente o desenvolvimento científico e tecnológico do país.

Leia a entrevista na íntegra baixando, gratuitamente, a quinta edição da revista ComTempo, clicando aqui.

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