Qual a importância da biblioteca para você?

Kimberly Souza

Fiz esta pergunta a vários amigos e as respostas giravam em torno de: “passei minha infância lá”, “adorava visitar aquele prédio antigo”, “li toda a saga de Harry Potter lá”. No meu caso, lembro-me, em uma época embaçada da vida, descobrir na biblioteca um refúgio diário. Saía de casa todos os dias, me jogava em um dos puffs amarelos e folheava diversos títulos: de autores brasileiros a aventuras de Sherlock Holmes.

Já nesta época, a biblioteca da cidade não era aquela monumental, instalada em um prédio antigo e importante. Ficava em um barracão. Com o passar dos anos e a chegada da vida adulta, este refúgio foi esquecido. Não só por mim, mas pelos amigos que indaguei e também pelo poder público.

O Sistema Nacional de Bibliotecas Públicas, do Ministério da Cultura, apontou, em 2014, a existência de 1 biblioteca para cada 33 mil habitantes. Segundo o Instituto Pró-Livro, em estudo realizado neste mesmo ano, 76% dos brasileiros não frequentam bibliotecas, o que reflete no já conhecido baixo índice de leitura do país, em torno de 4,96 livros lidos por ano, por habitante. Destes, 0,94 são livros exigidos pela escola e 2,88 são obras lidas por vontade própria. Quase 2 livros são terminados e 2,53, lidos em partes.

Por conta da má conservação do barracão, a biblioteca de Bebedouro, no interior de São Paulo, foi temporariamente desativada. Recentemente, encontrou refúgio – agora um para ela – em uma casa antiga, propriedade da prefeitura. As mais de 300 estantes foram encaixadas entre os cômodos e, desde então, o espaço está aberto à população das 7h às 16h. Há cidades, como a vizinha Taiúva, que está com a biblioteca desativada há anos e sem perspectivas.

Diante de tudo isso, o que podemos concluir? Quem podemos culpar? A princípio, sim, o Estado. Já não é novidade que a Cultura não é prioridade em nenhuma das esferas. Mas, atualmente, está sendo cada vez mais desmoralizada através de abusos de poder e atitudes falsamente moralistas que chegam a arrepiar a espinha. Não só parece, mas estamos regredindo uma década por dia no Brasil.

Em um segundo momento, a nossa parcela de culpa. Vivemos quase que totalmente em função da internet e a lógica da leitura também foi transferida para o meio digital. Hoje, quem lê, tem a facilidade de baixar um PDF ou e-book e ler a qualquer momento na tela do celular. Não é necessário ir até a biblioteca, emprestar o livro, prometer que vai devolver em uma ou duas semanas. O acesso está em nossas mãos, e a biblioteca tende a ficar obsoleta.

Mas, mesmo afirmando, eu discordo. A biblioteca municipal faz parte da nossa lógica de cidadão. Acredito que não seja possível existir um contexto sem ela. As bibliotecas municipais, portanto, precisam resistir e reafirmar sua importância. E isto pode ser feito em 3 passos: valorizar, exigir e conservar.

Pense na riqueza que habita aquele amontoado de livros. Eles constroem a nossa memória e fizeram parte da história individual de muita gente. Da minha, aos 12 anos. Da sua, lendo Harry Potter. Esta chance precisa existir para as gerações futuras, mesmo que a atenção tenha que ser dividida com tecnologia.

Para que este universo continue fazendo parte da nossa coletividade, precisamos lembrar, a todo o momento, que os engravatados dos palácios, plenários e prefeituras brasileiras, devem atender às nossas demandas. Vamos exigir! E, por fim (só para começar), vamos cuidar do que somos pelo que somos. Qual o valor da sua memória? E se, de repente, ela se desintegrasse? Não podemos deixar isto acontecer. E não vamos.

(Kimberly Souza, jornalista e editora da Comtempo, leitora voraz que não troca nada pelo prazer de folhear uma obra impressa).

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