Pornografia de Vingança: Antigos moldes que permanecem no meio digital

José Piutti

“Relacionar-se é caminhar na neblina sem a certeza de nada”, disse Zygmunt Bauman em seu livro “Amor Líquido”, onde alerta a sociedade sobre a crescente fragilidade das relações afetivas na atualidade. Em um mundo onde tudo se volta ao consumismo e a agilidade proporcionada pela internet, o sociólogo afirma que a necessidade de concretizar relações está suspensa.

Devido a correria do dia a dia, não existe tempo para aprofundamento de relações – que na maioria das vezes demandam-o em demasia – e a atualidade prova que é possível tratá-los com superficialidade ao habitar zonas de confortos que protegem do real.

 A tecnologia trouxe um novo modus operandi para as relações: o liga e desliga, antes utilizado em eletrodomésticos, tornou-se ferramenta utilizada em atividades interpessoais.  Aplicativos para relacionamentos, por exemplo, tornaram-se um novo botão para iniciar uma relação.

 O Tinder – aplicativo mais famoso do nicho – atingiu em 2014 marca de 100 milhões de usuários, sendo 10% deles, brasileiros. Dois anos depois, em 2016, anunciou que o recorde anterior havia sido ultrapassado, não revelando números brutos, dizendo apenas que o Rio de Janeiro é a cidade com mais usuários ativos, com  7,4% dos números globais.

 Deslizar o dedo para a direita – caso o perfil apresentado agrade o usuário – ou para a esquerda, caso contrário, é a maneira pela qual uma nova relação pode ou não surgir. Um “match” acontece se a  recíproca entre perfis for verdadeira e a partir daí, dura até o momento em que um deles desejar desativar a relação, seja ao apontar seus motivos ou apenas utilizar alguma artimanha digital, como bloquear o perfil do antigo affair.

 A estudante de psicologia Vanessa Delai, 20, utiliza o aplicativo há dois  anos e diz que as relações ali iniciadas têm tendência pouco duradoura. “A maioria dos matchs não saem do aplicativo e quando rola algum encontro, continua sendo algo superficial. É uma forma mais rápida de se conectar com alguém sem muitas dificuldades, e caso a pessoa não agrade ou ‘encha o saco’, é só desfazer o match’.

 Em entrevista a ComTempo, a jovem toca no assunto abordado no início desta reportagem. Em seu argumento, ela defende que muitas pessoas utilizam o Tinder para alimentar o ego dos usuários. “Os relacionamentos passageiros da sociedade líquida em que vivemos geram uma carência muito grande. As pessoas tentam suprir  isso por meio das redes sociais, pela quantidade de likes nas fotos ou de matchs, e assim por diante”.

 MANDA NUDES!

 Com a liquidez social, não só a procura pelo par perfeito ou paquera ideal sofreu mudanças. Há alguns anos, muito discutia-se sobre sexo no primeiro encontro. Hoje, um pequeno anglicismo foi adotado ao vocabulário brasileiro para definir um crescente fenômeno entre os jovens: sexting. Questões como ‘o tempo ideal para iniciar uma relação sexual com um novo parceiro’  caem por terra na medida em que se torna possível transar por meio de fotos, textos e vídeos, no conforto de sua casa.

 A expressão inglesa sexting, refere-se ao ato de trocar fotos, vídeos e até mesmo mensagens de texto de cunho erótico através de aparelhos eletrônicos, como computadores ou smartphones que segundo pesquisa realizada pela ComTempo, tem tornado algo completamente normal.

 A enquete respondida por 90 pessoas de idade entre 15 e 42 anos, mostra que 80% dos participantes já enviaram fotos íntimas para alguém.  O número dos que receberam fotos pessoais é maior, chegando aos 92,2%. Questionados sobre o compartilhamento de fotos de terceiros – ato considerado crime no Brasil -, 43,8% afirmou já ter praticado. Desse número, 62% é composto por homens.

 Gabriel Mariano (21), estudante de psicologia, enviou seu primeiro nude aos 18 anos, recebido em terras longínquas, em Portugal – outra artimanha da tecnologia. Segundo ele, o receptor o provocou por meio das mensagens de texto, deixando-o com vontade de enviar. “O ser humano quando está com tesão não pensa no que faz, apenas faz. As consequências vêm depois”, respondeu à ComTempo, após ser questionado sobre a possibilidade de ter seus nudes vazados. “Senti medo no começo, mas logo passou. Acho que isso é algo normal, cada um faz o que bem entender.”

 Já uma estudante do ensino médio, de 17 anos, que preferiu manter o anonimato, conta nunca ter trocado fotos íntimas. “Esse tipo de situação requer muita confiança e, para mim, é complicado confiar este tipo de conteúdo a alguém, não me sinto confortável.”  A questão de gênero é um dos principais fatores para a jovem evitar a prática. “Principalmente no caso das mulheres, uma foto vazada resulta em problemas sociais, psicológicos e familiares. Tenho amigos, por exemplo, que riram ao saber que seus nudes haviam sido vazados, enquanto uma amiga, que teve um vídeo atribuído a ela, tentou suicídio, e nem era ela”, conta.

 SE ORGANIZAR CERTINHO…

“Confesso que antes eu temia essa história de enviar nudes”,  diz um estudante de enfermagem que também não quis identificar-se. Ele, praticante assíduo do sexting, está inserido em grupo no WhatsApp que tem como objetivo a de troca de nudes próprios entre os integrantes.

Para ler a matéria completa, acesse a terceira edição da revista ComTempo.

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